"A Procuradoria-Geral da República (PGR) confirmou esta segunda-feira que estão em curso diligências para que os três secretários de Estado que solicitaram este domingo a exoneração do Governo sejam constituídos arguidos no caso Galpgate. Fernando Rocha Andrade, João Vasconcelos e Jorge Oliveira deverão ser notificados rapidamente para serem ouvidos nos próximos dias na Polícia Judiciária como suspeitos da alegada prática do crime de recebimento indevido de vantagem, tal como o Observador já tinha avançado.
Estão em causa “viagens, refeições e bilhetes para diversos jogos da seleção nacional no Campeonato Europeu de futebol de 2016″, refere o comunicado da PGR."
“No âmbito do inquérito relacionado com viagens ao Euro2016, o Ministério Público determinou a constituição como arguidos de três secretários de Estado agora exonerados (Internacionalização, Assuntos Fiscais e Indústria), estando em curso diligências para a concretização desse despacho”, informa a PGR.
Fonte: Observador (LINK)
A notícia é de ontem. Três secretários de Estado, com pastas que, direta ou indiretamente, tutelam áreas de interesse da Galp, viajaram e assistiram a vários jogos da seleção portuguesa no Euro 2016 por conta da empresa. Por causa dessas ofertas são agora suspeitos do crime de recebimento indevido de vantagem.
Recebimento indevido de vantagem é um crime que está dentro da esfera da corrupção. A moldura penal prevê uma pena até cinco anos de prisão para quem usufrui dessa vantagem, e três anos de prisão para quem a dê ou prometa. É considerado menos grave que corrupção passiva porque, para haver corrupção passiva, é necessário que seja praticado algum ato ou omissão contrário ao dever do cargo. Ainda assim, é de corrupção que estamos a falar.
Apesar de recebimento indevido de vantagem ser um crime apenas aplicável a titulares de cargos públicos, é impossível não fazer a transposição para aquilo que os emails do Benfica revelaram sobre ofertas dos bilhetes a dirigentes e funcionários da Liga e Federação. Ao contrário do que os benfiquistas dizem, não falamos de cedências de bilhetes previstas nos regulamentos, pois nos regulamentos não estão previstas ofertas de convites duplos a quem quer que seja. Tem direito ao bilhete o dirigente ou funcionário em causa, não havendo direito a acompanhantes. Para além disso, cedências de bilhetes previstas nos regulamentos não têm que ser alvo de discussão interna entre administradores e assessores da SAD. Ou têm direito ou não têm. No âmbito dessa discussão interna, ficou claro que, em várias circunstâncias, o Benfica ofereceu bilhetes na perspetiva de obter vantagens para si ou como agradecimento por benefícios obtidos no passado.
Para quem diga que os dois casos são diferentes pelo facto de falarmos de bilhetes de futebol e de o Benfica ser um clube de futebol... seria menos grave se a Galp oferecesse combustível aos secretários de Estado? Obviamente que não. E seria menos grave se o Benfica oferecesse combustível aos dirigentes e funcionários da Liga e Federação. Claro que não.
Recuperemos os casos que envolvem o Benfica:
- Cinco elementos da secção não profissional do Conselho de Disciplina terão recebido, cada um, um convite duplo para o Benfica - Juventus, porque, segundo Paulo Gonçalves, "estavam cheios de moral". Dias antes, este mesmo órgão tinha livrado Jorge Jesus de um castigo pesado.
- Andreia Couto, Nuno Cabral e Emídio Fidalgo terão recebido convites para a final da Liga Europa entre Benfica e Sevilha, por, segundo Paulo Gonçalves, terem "de alguma maneira (...) ajudado o SLB no passado". Nuno Cabral era o delegado da Liga que, apenas um mês antes, tinha enviado documentos a Paulo Gonçalves e Vieira, na ânsia de se tornar "o menino bonito do Benfica". Emídio Fidalgo era o responsável dos delegados que, oito meses antes, fez vista grossa aos incidentes que envolveram Jesus e a polícia num jogo em Guimarães.
- O mesmo Nuno Cabral terá recebido cinco convites para assistir ao Benfica - Nacional. A particularidade que torna este exemplo ainda mais delicioso, é que o Benfica sabia que dois desses convites se destinariam a árbitros assistentes... Por seu turno, Ferreira Nunes, responsável pelas classificações do árbitro, foi mais afortunado: ele e o filho tiveram direito a lugares no camarote presidencial.
- Simões Dias, antigo delegado da Liga, viu-lhe serem "desenrascados" dois bilhetes para o Benfica - Nacional, jogo do título de 2015/16. Os bilhetinhos foram oferecidos porque, segundo Paulo Gonçalves, Simões Dias fez uma omissão num relatório de jogo que o "safou" a ele e a Nuno Gomes de uma sanção mais pesada, acabando, o próprio Simões Dias, por sofrer as consequências dessa omissão ao ser supenso por 18 meses por falsificação de relatório.
- Luciano Gonçalves, presidente da APAF, solicitou 50 bilhetes a preços de amigo. Domingos Soares de Oliveira "insistiu" que se oferecessem esses bilhetes, "tendo em consideração quem é" a pessoa em questão. Paulo Gonçalves concordou com a oferta, pois, segundo o que escreveu, nunca é bom ter alguém como Luciano Gonçalves contra o Benfica, ainda mais quando o presidente da APAF seria uma das testemunhas a ser ouvida num processo que interessava ao clube.
Só não percebe as motivações destas ofertas quem não quiser. Falamos de pessoas que ocupam ou ocupavam cargos em que a isenção é um fator essencial, algumas das quais com poder para influenciar o desfecho de situações que podem afetar o decurso das competições. Algumas delas cometeram, comprovadamente, atos ou omissões contrários ao seu cargo com o intuito consciente de ajudar o Benfica. Tudo junto, e à luz do que podemos observar no caso da Galp, vamos continuar a fingir que, no caso do Benfica, não existem fortes indícios de corrupção?
P.S.: a imagem que coloquei para ilustrar este post é de um bilhete oferecido pelo Gabinete Jurídico do Benfica (onde trabalha Paulo Gonçalves)... ao irmão de Nuno Cabral, árbitro de futebol (LINK). Ninguém revelou emails sobre esta oferta em particular, pelo que não sabemos por que motivo o dito bilhete foi oferecido. Mas lá que é mais uma oferta curiosa, lá isso é...
P.S.: a imagem que coloquei para ilustrar este post é de um bilhete oferecido pelo Gabinete Jurídico do Benfica (onde trabalha Paulo Gonçalves)... ao irmão de Nuno Cabral, árbitro de futebol (LINK). Ninguém revelou emails sobre esta oferta em particular, pelo que não sabemos por que motivo o dito bilhete foi oferecido. Mas lá que é mais uma oferta curiosa, lá isso é...