Novo texto do 3295C.
Rui,
Tal como tu esperaste pelo momento certo para te pronunciares sobre o teu pedido de rescisão, também eu esperei que o fizesses para te dizer o que fizeste aos Sócios do Clube que te criou e que te apoiou nos bons e nos maus momentos, desde que vieste, pequeno, de tua casa, e reforçado quando legítima e justamente assumiste a posição de guarda-redes naquele célebre jogo nos Barreiros, sobre o que nos aconteceu. Aos dois. A ti e aos Sportinguistas.
Na tua carreira de número 1, prometeste e cumpriste, com altos e baixos como qualquer ser humano que dizes ser e és, com a família leonina invariavelmente do teu lado. Nem sequer acredito que tenhas levado a mal a queda das tochas no relvado no jogo com o Benfica. Já vi uma imagem desse momento em que estás a sorrir, como quem sabe do que a casa gasta. Tantos anos estiveste sentado no trono da baliza Vítor Damas, que não seria desta vez que te caía mal. Se calhar caiu e não estarei a ser justo, mas mesmo que tenhas levado a mal esse episódio, tudo o que te tenho para dizer como adepto e Sócio do Sporting, minimizará essa situação.
Considerei a tua carta uma autêntica contradição do princípio ao fim. Numa versão mais suave, diria que te foi difícil fazer a distinção entre o coração que dizes ter de leão e o profissional que és do Sporting Clube de Portugal. Contratualmente, poderás ser da Sporting SAD, mas a última vez que consultei a composição accionista do teu patrão, o accionista maioritário ainda é o Sporting Clube de Portugal, o Clube que tu representas e onde dizes ter o teu coração.
Percebes bem o significado da expressão “onde se tem o coração”?
Dizes que explicaste tudo e bem na carta do teu pedido de rescisão. Gostei de ver a união de balneário em alguns elementos, por sentirem exactamente as mesmas coisas, das mesmas frias maneiras em linguagem quase jurídica. Não foi chato o que vos aconteceu. Foi uma tragédia cujas consequências não caíram em saco roto e sei que irás acompanhar o processo até ao fim, tal como eu, se realmente continuas a sentir-te leão. Até porque tu és um dos queixosos.
Vamos à decisão que tomaste, de livre vontade. A partir do momento que o fizeste, abandonaste precisamente o teu clubismo para pensar como o ser humano jogador profissional de futebol Rui Patrício. Decidiste perante um dilema que tinha surgido na tua vida.

Talvez tenha sido melhor assim. Se não aconteceu, foi porque eventualmente não o tivesses merecido.
És um profissional e eu aceito a tua decisão do ponto de vista laboral, mas não venhas depois dizer que continuarás a ser leão e que respeitas o Clube. Isso é não ter a noção do ridículo. Já percebeste que, do teu ponto de vista, tu queres sair do Sporting a custo zero, apagando precisamente os últimos 20 anos da tua vida como se o Sporting tivesse sido um mero instrumento de ascensão e aprendizagem na carreira? Considerarás que o Sporting merece ser assim castigado? Sabes muito bem do que vivem os clubes e a tua decisão como profissional de futebol prejudicou os interesses do Sporting Clube de Portugal em vários milhões de euros. No mínimo, é uma certa bipolaridade tua: o jogador profissional Rui Patrício tem toda a razão em querer uma rescisão com justa causa, mas o leão Rui Patrício reconhece o trajecto todo no Clube e leva-o no coração para sempre. Estás óptimo para Miss Universo. Querem sempre sol na eira e chuva no nabal para todo o Mundo.
Esperei de ti um capitão de equipa a liderar no momento certo, mas falhaste-me. Foste líder, mas dando um mau exemplo. E não compreendo como podes ter saído de Alvalade para um estádio com nome de batedeira e ainda por cima mal escrito. Inacreditável. O capitão de equipa do Sporting Clube de Portugal, campeão europeu de selecções, que julgaria poder sair, um dia, para um grande emblema europeu.
Tomaste a tua decisão e eu, como Sócio, tomei a minha. Adeus, Rui. Passaste a ser, simplesmente, um guarda-redes que fez a formação no Clube e saiu ao fim de 20 anos pela porta 5B.
Vais aprender no teu novo balneário a expressão ‘no hard feelings’. E recordas-te do dilema que referi atrás? Vai ver o que escreve Ortega Y Gasset sobre as circunstâncias serem o dilema perante o qual temos de nos decidir.