sexta-feira, 6 de julho de 2018

Carta aberta a Rui Patrício (@3295c_)

Novo texto do 3295C.



Rui,


Tal como tu esperaste pelo momento certo para te pronunciares sobre o teu pedido de rescisão, também eu esperei que o fizesses para te dizer o que fizeste aos Sócios do Clube que te criou e que te apoiou nos bons e nos maus momentos, desde que vieste, pequeno, de tua casa, e reforçado quando legítima e justamente assumiste a posição de guarda-redes naquele célebre jogo nos Barreiros, sobre o que nos aconteceu. Aos dois. A ti e aos Sportinguistas.

Na tua carreira de número 1, prometeste e cumpriste, com altos e baixos como qualquer ser humano que dizes ser e és, com a família leonina invariavelmente do teu lado. Nem sequer acredito que tenhas levado a mal a queda das tochas no relvado no jogo com o Benfica. Já vi uma imagem desse momento em que estás a sorrir, como quem sabe do que a casa gasta. Tantos anos estiveste sentado no trono da baliza Vítor Damas, que não seria desta vez que te caía mal. Se calhar caiu e não estarei a ser justo, mas mesmo que tenhas levado a mal esse episódio, tudo o que te tenho para dizer como adepto e Sócio do Sporting, minimizará essa situação.

Considerei a tua carta uma autêntica contradição do princípio ao fim. Numa versão mais suave, diria que te foi difícil fazer a distinção entre o coração que dizes ter de leão e o profissional que és do Sporting Clube de Portugal. Contratualmente, poderás ser da Sporting SAD, mas a última vez que consultei a composição accionista do teu patrão, o accionista maioritário ainda é o Sporting Clube de Portugal, o Clube que tu representas e onde dizes ter o teu coração.

Percebes bem o significado da expressão “onde se tem o coração”?

Dizes que explicaste tudo e bem na carta do teu pedido de rescisão. Gostei de ver a união de balneário em alguns elementos, por sentirem exactamente as mesmas coisas, das mesmas frias maneiras em linguagem quase jurídica. Não foi chato o que vos aconteceu. Foi uma tragédia cujas consequências não caíram em saco roto e sei que irás acompanhar o processo até ao fim, tal como eu, se realmente continuas a sentir-te leão. Até porque tu és um dos queixosos.

Vamos à decisão que tomaste, de livre vontade. A partir do momento que o fizeste, abandonaste precisamente o teu clubismo para pensar como o ser humano jogador profissional de futebol Rui Patrício. Decidiste perante um dilema que tinha surgido na tua vida.

Tu, Rui, que já levavas 20 anos de Sporting, que cresceste no Clube e passaste mais tempo na nossa casa do que na dos teus pais, como tu próprio disseste. Além disso, eras o capitão de equipa, Rui. O líder do balneário. E talvez não andes a fazer essas contas, mas com mais uma época e tornavas-te no jogador que mais vezes usou a Listada verde e branca. Ultrapassavas o grande senhor Hilário. Sabias? Como pudeste desperdiçar assim a eternidade que o Sporting te oferecia, aliado a outros nomes na posição que ocupaste, repito, com braçadeira, como Damas, Carlos Gomes, Carvalho…

Talvez tenha sido melhor assim. Se não aconteceu, foi porque eventualmente não o tivesses merecido.
És um profissional e eu aceito a tua decisão do ponto de vista laboral, mas não venhas depois dizer que continuarás a ser leão e que respeitas o Clube. Isso é não ter a noção do ridículo. Já percebeste que, do teu ponto de vista, tu queres sair do Sporting a custo zero, apagando precisamente os últimos 20 anos da tua vida como se o Sporting tivesse sido um mero instrumento de ascensão e aprendizagem na carreira? Considerarás que o Sporting merece ser assim castigado? Sabes muito bem do que vivem os clubes e a tua decisão como profissional de futebol prejudicou os interesses do Sporting Clube de Portugal em vários milhões de euros. No mínimo, é uma certa bipolaridade tua: o jogador profissional Rui Patrício tem toda a razão em querer uma rescisão com justa causa, mas o leão Rui Patrício reconhece o trajecto todo no Clube e leva-o no coração para sempre. Estás óptimo para Miss Universo. Querem sempre sol na eira e chuva no nabal para todo o Mundo.

Esperei de ti um capitão de equipa a liderar no momento certo, mas falhaste-me. Foste líder, mas dando um mau exemplo. E não compreendo como podes ter saído de Alvalade para um estádio com nome de batedeira e ainda por cima mal escrito. Inacreditável. O capitão de equipa do Sporting Clube de Portugal, campeão europeu de selecções, que julgaria poder sair, um dia, para um grande emblema europeu.

Tomaste a tua decisão e eu, como Sócio, tomei a minha. Adeus, Rui. Passaste a ser, simplesmente, um guarda-redes que fez a formação no Clube e saiu ao fim de 20 anos pela porta 5B.

Vais aprender no teu novo balneário a expressão ‘no hard feelings’. E recordas-te do dilema que referi atrás? Vai ver o que escreve Ortega Y Gasset sobre as circunstâncias serem o dilema perante o qual temos de nos decidir.