Quando fiz a análise das contas do 1º semestre apontei três problemas essenciais que a SAD está a enfrentar:
1. A redução das receitas operacionais
2. A falta de ajustamento dos custos à previsível redução de receitas
3. As necessidades de tesouraria de curto prazo
São três questões que a atual administração da SAD pouco ou nada pôde fazer para evitar ou reverter, uma vez que entrou em funções apenas após o fecho do mercado de verão. É que, por um lado, as receitas ordinárias ficam definidas em meados de agosto, mais milhão menos milhão; por outro, os custos operacionais estão altamente dependentes da massa salarial do plantel, que fica fechado a 31 de agosto.
Infelizmente, a Comissão de Gestão pouco fez para emagrecer o plantel sabendo que não havia Champions e que a venda de Gameboxes não acompanhava o ritmo de épocas anteriores. Não só deu aumentos incomportáveis a Dost e Battaglia, como, sobretudo, não se desfez de praticamente nenhum contrato de jogadores cujo rendimento desportivo fica muito aquém do custo financeiro. E ainda gastou praticamente todo o dinheiro que havia para investir em Diaby. À tragédia que vivemos no final da época passada, sucedeu-se a falta de competência de quem preparou 2018/19.
Isto tudo condiciona, como é óbvio, as contas do 3º trimestre da época. Os primeiros três meses de 2019 não podiam trazer quaisquer novidades em relação ao primeiro ponto, visto que a não qualificação para a Liga dos Campeões e a redução das receitas das gameboxes são fatalidades que não há forma de inverter com a época em andamento. O melhor que se pode fazer em relação a isso é agir em conformidade no segundo ponto, ou seja, ajustar o custo do plantel às receitas esperadas. Infelizmente, o momento certo para o fazer é entre junho e finais de agosto. A direção de Frederico Varandas fez o possível em janeiro, dispensando alguns atletas que auferiam vencimentos elevados e substituindo-os (ou não substituindo sequer) por outros com salários mais reduzidos - felizmente sem consequências desportivas nefastas, bem pelo contrário. O terceiro ponto acima referido, relativo às necessidades de tesouraria, foi temporariamente resolvido com a antecipação de 65 milhões de euros do contrato dos direitos televisivos. E digo temporariamente porque, para ser definitivo, é preciso adequar os custos às receitas sob pena de andarmos a alimentar consecutivamente défices nas contas e na tesouraria.
Ou seja, começa agora o período onde poderemos efetivamente avaliar a capacidade da atual administração da SAD. O desafio não será fácil: aumentar significativamente a competitividade do plantel de 2019/20, ao mesmo tempo que reduz o seu custo.
Passemos então à análise dos números do 3º trimestre.
Receitas operacionais
A redução das receitas operacionais devem-se, principalmente, à não participação na Liga dos Campeões. Em 2017/18, os prémios da UEFA foram a principal fonte de rendimento da SAD. Em 2018/19, fruto da participação na Liga Europa, esse valor caiu para menos de metade. Para além disso, não participar na Liga dos Campeões reflete-se também nos direitos televisivos (por causa do marketpool da UEFA) e na bilheteira.
Detalhando a bilheteira, houve uma quebra de 650 mil euros na venda das Gameboxes e perdemos cerca de 1 milhão na bilheteira das competições europeias. Houve, no entanto uma recuperação ao nível das competições nacionais e um aumento ao nível dos camarotes e business seats.
Custos com pessoal
Em linha com os relatórios anteriores, o custo salarial do plantel é excessivo para as receitas existentes.
Apesar de terem saído alguns jogadores críticos no final da época passada e da redução de qualidade geral do plantel, continuamos a gastar ao mesmo nível de 2017/18. Mas olhando para o detalhe do custo dos salários trimestre a trimestre, os números ficam ainda mais surpreendentes:
No 1º trimestre, o custo do plantel foi mais baixo do que em 2017/18. Isso explica-se pelo facto de muitos dos reforços terem chegado tarde e por não termos pago os salários dos jogadores que rescindiram e mais tarde voltaram durante uma parte desse trimestre.
No entanto, no 2º trimestre, com o plantel completo, gastámos mais na época atual do que em 2017/18 - o que é inadmissível considerando a (falta de) qualidade do plantel. Pior: no ano passado o peso do salário de Jesus nos custos de pessoal era significativamente superior ao de Peseiro/Keizer.
No 3º trimestre houve uma redução significativa dos custos salariais, fruto das movimentações de mercado. Sem salários como os de Nani, Montero, Marcelo ou Bruno César, e reforçando a equipa com jogadores mais baratos como Luiz Phellype, Borja, Ilori ou Doumbia, foi possível baixar a folha salarial em mais de 2,5 milhões (o que corresponderia a 10 milhões anuais caso estas medidas tivessem sido tomadas no início da época).
Endividamento
Como se esperava, houve um aumento significativo do endividamento devido à antecipação de 65 milhões de receitas do contrato de direitos televisivos.
Destes 65 milhões, o clube ainda tinha cerca de metade em caixa (no ativo). A restante metade distribuir-se-á entre pagamentos a fornecedores e pagamentos à banca. Infelizmente, sendo este relatório uma imagem do estado das contas no dia 31 de março, não é possível saber ao certo no que é que o dinheiro foi aplicado. O que se pode ver é que, apesar de esta antecipação de receitas provocar um aumento de 65 milhões no passivo, o passivo total a 31 de março aumentou "apenas" 48,7 milhões em relação a 31 de dezembro. Ou seja, isto indicia que a outra metade do dinheiro da antecipação foi usado para abater outros passivos (a conta não é direta porque entretanto vão surgindo novos passivos, como, por exemplo, as contratações de Doumbia, Ilori, Borja, Plata e Matheus Nunes).
Notas finais
- O Sporting apresentou um prejuízo de 5,9 milhões após ter registado um lucro de 6,4 milhões nas contas do 1º semestre. Era previsível, já que, não tendo havido encaixes significativos com vendas de jogadores em janeiro, o 3º trimestre é o pior em termos de receitas ordinárias.
- O acordo por Gelson foi fechado após 31 de março, pelo que as mais-valias registadas ainda não entraram nestas contas.
- Em contas por alto, parece-me que não será necessário vender até 30 de junho para ter contas relativamente equilibradas no final da exercício. No entanto, creio que será necessário fazer uma excelente venda no defeso de forma a financiar o reforço do plantel e assegurar o preenchimento das necessidades de tesouraria da época - para além, claro, de resolver a situação de jogadores como Viviano, Bruno Gaspar, Jefferson, Lumor, André Pinto, Ilori, Petrovic, Battaglia, Misic, Mattheus Oliveira, Diaby e Dost.