quarta-feira, 4 de dezembro de 2019

As contas do 1º trimestre

O Sporting comunicou à CMVM, na noite passado do sábado, as contas referentes ao 1º trimestre de 2019/20. Foi apresentado um resultado positivo de 21,1 milhões obtidos, sobretudo, devido à às mais-valias dos passes de Raphinha e Thierry Correia nos últimos dias do mercado de transferências. Infelizmente, apesar do lucro obtido - sempre enganador quando falamos do 1º trimestre de um exercício -, o panorama geral é preocupante. A dependência da SAD das receitas extraordinárias (como vendas de jogadores e prémios de competições europeias) mantém-se demasiado elevada, o que leva a que a atual ineptidão desportiva - equipa de futebol à deriva e que dispõe de um único jogador capaz de proporcionar uma venda considerável a curto prazo - tenha efeitos duplamente nefastos: não só pelos objetivos desportivos que vão caindo prematuramente, mas também pelo cumprimento das obrigações financeiras da época. 


1. Receitas operacionais



As receitas operacionais ordinárias tiveram aumentos na casa dos 10% ao nível dos bilhetes de época (infelizmente, terá sido mais por causa do aumento significativo dos preços das Gameboxes do que pelo aumento do número de Gameboxes vendidas), patrocínios, camarotes e business seats e merchandising, tendo-se voltado, de uma forma geral, ao nível atingido há dois anos.

Os prémios da UEFA são mais reduzidos do que em 2018/19 porque na época passada houve uma correção positiva referente à participação da Liga dos Campeões de 2017/18, e também porque, até setembro de 2019, apenas foi disputado um jogo da Liga Europa que acabou em derrota - e, portanto, sem direito a prémio monetário.


2. Custos


Custos com pessoal 

Inesperadamente, registou-se um aumento de 3,2 milhões de euros relativamente a 2018/19. No R&C, a SAD deu a seguinte explicação para esse aumento:
Os gastos com pessoal cresceram cerca de 3,2 milhões de euros face ao mesmo período da época passada, no entanto, importa referir que este aumento é explicado por dois efeitos contrários: i) redução trimestral dos gastos com jogadores e colaboradores em cerca de 1,3 milhões de euros e ii) aumento das indemnizações em 4,7 milhões de euros. O valor relativo às indemnizações por rescisão de contratos de trabalho ascende a cerca de 5 milhões de euros, mas permitirá uma poupança líquida de cerca de 25 milhões de euros, parte significativa da qual irá-se refletir ainda na corrente época.
Suponho que as indemnizações por rescisão de contratos incluam Keizer e a sua equipa técnica, e jogadores como Viviano, Salin, Jefferson e Wallyson (que rescindiram) e, eventualmente, como Alan Ruiz, Petrovic ou André Pinto (como "motivação" para assinarem por outros clubes). Ainda assim, percebendo a poupança que isso implicará em comparação com o que se teria de pagar até ao final dos respetivos contratos, o balanço do trabalho de cortes está longe de ser positivo. A redução de 1,3 milhões em jogadores e colaboradores é claramente insuficiente, ainda mais olhando para a fraquíssima valia desportiva de um plantel que está mais perto das posições de despromoção do que do 1º lugar.


FSE's

Houve um aumento de 21% dos fornecimentos e serviços externos, que está distribuído por diversas componentes. No entanto, há uma delas em que o aumento dá particularmente nas vistas: 


O R&C explica que o "aumento dos gastos com organização, deslocações e estadias em jogos está relacionado com o jogo de pré-época com o Liverpool disputado em Nova Iorque e com a sazonabilidade das deslocações da Liga Europa.". A sazonabilidade da Liga Europa explica-se com a deslocação à Holanda para defrontar o PSV (na época passada o 1º jogo da Liga Europa foi em casa). Ainda assim, podemos assumir que a maior parte dos 924.000 euros a mais que se gastou se deverá à deslocação a Nova Iorque - mais prolongada e mais longa do que a de Eindhoven. No entanto, se olharmos para um detalhe ao nível das receitas, vemos que...


... a SAD só encaixou cerca de meio milhão em competições particulares. Isto dá a entender que a participação do Sporting no particular com o Liverpool terá dado prejuízo, o que seria, no mínimo, ridículo. Espero que haja algum proveito escondido noutra rubrica, porque obrigar a equipa a uma deslocação destas, com o impacto que tem na pré-época, e ainda ter de pagar por isso no final... seria absurdo.


Dependência das receitas da UEFA e venda de jogadores

Os valores das indemnizações têm algum peso no défice operacional que se registou, mas, mesmo assim, a dependência dos prémios das competições europeias e das mais-valias de jogadores continua demasiado elevada.



3. Dívida


O aumento global do endividamento relativamente a junho de 2018 não é novidade, devido à operação de antecipação das receitas do contrato da NOS realizada em março de 2019. No entanto, há um efeito secundário que ainda não era conhecido mas que é bastante desagradável: o pagamento de juros da dívida durante o 1º trimestre de 2019/20 disparou de 1,271M para 2,964M. Ou seja, teremos de contar com um aumento de juros anuais na casa dos 7 milhões de euros. O período dos juros baixos acabou em definitivo para o Sporting.


4. Outras notas

  • Curioso o acordo que o Sporting fez com Podence: dos 7 milhões, apenas vamos receber 2 milhões até setembro de 2020; o Olympiacos só terá de pagar os outros 5 milhões depois disso; e 10% do valor total da compensação foi atribuído em comissões a Jorge Mendes.
  • Até 30 de setembro de 2019, o Valência tinha pago 3 milhões relativos à transferência de Thierry Correia; o clube espanhol pagará mais 3 milhões até 30 de setembro de 2020 e 6 milhões depois dessa data.
  • O Rennes já pagou cerca de metade do valor de transferência de Raphinha.
  • Dos 53,500 milhões de vendas de jogadores, 5,9M foram pagos em intermediações, ou seja, um valor médio superior a 10% (no caso da venda de Thierry atingiu uns obscenos 16,7%).